Profissão Repórter sobre as motos
A Globo transmitiu na última terça-feira, dia 15, no programa Profissão Repórter, uma reportagem sobre “o aumento da frota de motos e suas consequências”.
Como aconteceu com as matérias anteriores sobre motos transmitidas pela Globo, esta basicamente mostrou motoboys e pessoas que andam de motos em lugares carentes do Brasil. Mostrou que no Nordeste e Norte do país a maioria das pessoas que andam de moto não são habilitadas, e que não usam capacete, dando as mais absurdas justificativas para cometer tais infrações. Mostrou ainda gente agonizando no hospital devido a acidentes de moto… aquele velho show do horror de sempre.
Aqui em São Paulo, a reportagem mostrou os acidentes entre os motoboys, mostrou que milhares de motos são apreendidas porque seu condutor não possui habilitação para conduzir motos. Mostrou também uma mulher que anda em uma Dragstar e tem um capacete preto. (???)
Para ver os vídeos do programa, visite esta página no site oficial do programa.
E a reportagem acabou de um jeito estranho. Mostrando um sujeito falando algo que eu não entendi sobre o ronco do motor da moto dele. E logo já entrou a vinheta do Jornal da Globo, deixando a todos com aquela sensação de “tá, mas e ai?”. O programa acabou e não chegou a conclusão alguma! Só mostrou, mostrou e mostrou, mas não disse nada!
Tudo o que ele mostrou nós já sabemos! Sabemos que acidentes acontecem, sabemos que andam sem habilitação, que andam sem capacete, e que o resultado disso são os acidentes. Faltou dizer de quem é a culpa e dizer como resolver o problema.
Por que é que uma pessoa não habilitada pilota uma moto? Por que é que sobem três em uma moto sem capacete? A resposta é uma só: Não há fiscalização. A lei não chega a todos os lugares do Brasil. Mal chega as capitais, que dirá nos confins do interior deste imenso Brasil. Prova disso são as desculpas que as pessoas dão: “Capacete só precisa na BR” ou “Eu não tenho Habilitação mas sou formada técnica em enfermagem” (sic). Eu não entendo o que se passa na cabeça dessa gente, mas com certeza eles estão, no mínimo, mal informados.
A culpa é, principalmente, do governo, que não tem capacidade para fiscalizar as ruas e estradas, que não exige treinamento adequado aos novos condutores nas moto-escolas, que cobra impostos absurdamente altos para os equipamentos de segurança importados e não incentiva o surgimento de boas indústrias nacionais, e que permite que uma pessoa sem habilitação compre uma moto.
A culpa também é da mídia de massa, TV em especial. São raríssimas as campanhas para conscientização sobre segurança das motos. A Internet tem muito conteúdo de boa qualidade sobre segurança em motocicletas, mas ainda falta divulgação, e este é um canal que não chega a muitas pessoas, principalmente nas regiões onde a informação é mais necessária.
Abro um parêntese na conversa para comentar um fato relacionado: Há duas semanas atrás a própria TV Globo denunciou no fantástico um enorme esquema de propina das vans do Rio de Janeiro. Recomendo assistir essa reportagem, mas resumindo, os proprietários de vans eram obrigados a pagar propina para não tomar multas. O problema não é que eles cometiam infrações e então eram multados. Na verdade, os guardas aplicavam multas aleatórias em todas as vans, e desta forma ficaria impossível trabalhar sem que entrassem no esquema.
Entrando no esquema então, os proprietários das vans passaram a não mais receber multas, nem mesmo as das infrações que eram cometidas, e as vans passaram a lucrar menos, já que agora que tinham que desviar grande parte do lucro para propinas. Desta forma, a manutenção das vans ficou precária, e quem seria responsável por fiscalizar isso está sendo pago para não faze-lo.
Percebeu que o passageiro, usuário do serviço, simplesmente não entrou na equação? Ele tem agora um transporte precário e ninguém está fiscalizando.
Isso acontece no Brasil inteiro, de formas diferentes, mas sempre com o mesmo resultado: Transporte público caro, ineficiente e inseguro. Depois não sabem porque é que o número de motos no país quadruplicou em 10 anos, e se espantam ao saber que a maioria simplesmente ignora as leis: Querem apenas um meio de transporte que seja realmente deles, que possam contar e usar sempre que precisarem, e que não dependa da boa vontade de governos e de gente corrupta.
Portanto, aquelas pessoas precisam das motos. O objetivo das campanhas não deve ser o de desmotivar o uso da moto, já que isso não vai funcionar. O objetivo deve ser o de conscientizar sobre o uso correto da moto, incentivando o treinamento e o respeito as leis e o uso de equipamentos de segurança, e um bom início seria falar do básico: “CNH e capacete são necessários para o piloto e para o passageiro de qualquer tipo de moto, em qualquer lugar do Brasil”. Uma vinheta de 5 segundos com estes dizeres, exibida umas 4 ou 5 vezes por dia na TV já faria muita diferença.
Outro objetivo deve ser o de denunciar os absurdos: Uma mãe levar os 2 filhos na moto só é absurdo se o ônibus estiver passando na frente de casa dela a cada 30 minutos. Caso contrário, o absurdo está no fato do ônibus não existir.
Não há vergonha nenhuma em ter apenas uma opção de transporte, e usa-la. Vergonha é ficar omisso e se deixar perecer diante de tanto descaso.
Que você acha?